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A nossa longevidade e a brevidade dos pets: por que eles partem tão cedo?

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por Airton Gontow

 

Nos últimos 30 anos a expectativa de vida de cães e gatos dobrou. Mesmo assim, ao ver nossos filhinhos partirem, os avanços parecem andar a passos de tartaruga.

Eu e minha amada Laila
Laila e eu.

Muitas são as pessoas que já sonharam em viver para sempre, desde que com conforto, vigor e saúde.

Mas quantas gostariam que a imortalidade ou vida longa fosse uma conquista meramente individual?

Certamente raríssimos casos.

Afinal, é quase impossível sobreviver à perda da companheira amada, dos filhos, dos netos, de todos os amigos…e ser feliz.

Perder os pais, os avós e alguns amigos leva a uma dor incomensurável, que muitas vezes fica para sempre. Mas faz parte da ordem natural da vida.

Já viver sem nossos descendentes é um peso, não uma benção!

Se o Homem ainda está longe da imortalidade, impressionam os relatos de que avança, a passos largos, a perspectiva de vida humana em todo o Planeta…

Algumas informações parecem invencionices ou pura ficção científica. Quer um exemplo? Estudos da Universidade da Singularidade, financiadas pela Nasa e pelo Google, apontam que a expectativa de vida poderá saltar para incríveis 200 anos já em 2040 (para os nascidos nessa época!). Veja bem: não estamos falando sobre um futuro distante, mas em ¼ de século!

Em três décadas haverá uma grande revolução na Saúde, com transfusões de células-tronco, que tornarão possível a regeneração de células mortas. Nano-robôs, máquinas minúsculas, quase invisíveis e seis vezes menores que um glóbulo vermelho, poderão entrar na corrente sanguínea e combater o avanço de doenças. Haverá transplantes feitos com órgãos clonados do próprio doador. Os cientistas acreditam que será possível para a Humanidade a prevenção, desde a infância, de doenças que surgiriam ao longo da vida!

Viveremos mais e melhor, ao lado dos nossos descendentes.

Sim, ao lado de nossos descendentes, mas não de todos os nossos filhos!

Falo de nossos cães e gatos, filhinhos queridos que enchem nossas vidas de alegria e amor incondicional.

Se pensarmos nos números, os avanços são notáveis. Nos últimos 30 anos, a expectativa de vida de cães e gatos praticamente dobrou. Cães de pequeno porte, que viviam em média nove anos, agora chegam aos 18, em boas condições de saúde. Os cães de grande porte passaram dos sete para os 13 anos de vida. Gatos que viviam dez anos hoje chegam a 20!

Há em todo o mundo diversos casos de gatos que se tornaram trintões! No Guiness Book consta um gato que viveu entre 34 e 36 anos. Sem comprovação oficial, há o relato de um gato que viveu 43 anos e ainda tinha saúde para escapulir por aí: morreu atropelado por um trem!

Laila!

Mesmo com tudo isso, ao ver nossos filhinhos partindo, os avanços parecem andar a passos de tartaruga.

É tudo tão rápido! De repente está diante de nós aquela bolinha de pelo que não para quieta, que agita, que corre para cima e para baixo. Logo cresce. De repente, “não mais que de repente”, vira nosso companheiro para todas as horas. Quando vemos, nosso bichinho já envelheceu, em um piscar de olhos, e fazemos de tudo para cuidar, para preservar, para manter por perto nosso filhinho ancião.

Mas não conseguimos.

Momento inesquecível.
Laila, Maria e eu: momento inesquecível.

Há pouco eu e minha esposa Maria perdemos a nossa Laila. Uma pastora alemã linda, meiga, que não gostava muito de outros cães, é verdade, mas era mansa com os humanos, e que vivia para dar e receber nosso amor. Meu e de Maria.

É o terceiro filhinho cão que perdi em 53 anos de vida. A primeira, na infância e parte da adolescência, foi uma pequinês, a Jacque, que veio de Porto Alegre com a gente.

Há oito anos perdi o Kelev, um impressionante Pastor com Fila, com quase 55 kg de pura doçura e não sabia o tamanho e a força que tinha. Kelev significa “cachorro”, em hebraico. Vem da junção de duas palavras: Kmo (“assim como”) e Lev (“coração”). Nunca vi palavra tão apropriada: para os israelenses, cachorro é “assim como o coração”.

E assim era o meu Kelev. Ao contrário da Laila, que sempre soube ser uma cachorra, era desses cães que ‘pensava’ ser humano. E não é que todo mundo dizia: “mas esse cachorro tem o olhar de ser humano!”?

Ao lado do Kelev
Ao lado do Kelev

Agora foi a vez da Laila.

Certa noite ficou esquisita.

Quase não se mexia.

Tentava, em vão, vomitar.

Não aceitou o adorado pedaço de maçã!

Não mostrou ânimo nem diante da coleira com o famoso
“Vamos passear?”

Preocupados, fomos para um veterinário 24 horas, pertinho de nossa casa.

Laila estava com Torção Gástrica.

– É muito perigosa para uma cadela de 12 anos” – explicou a veterinária.

Laila fez ultrassom, foi sedada…

Com a sonda a veterinária conseguiu reverter a situação.

Nossa linda pastora ficou internada na clínica.

No dia seguinte a veterinária pediu que não fôssemos, para não agitar nossa filhinha,

Mas nos tranquilizou contando que Lailinha acordou animada e que até passeou.

Maria limpou a caminha da Laila, lavou o patinho de plástico lilás que ela havia adotado e deixou tudo pronto para recebê-la.

Mais tarde fomos informados de que talvez a alta não fosse naquele dia, porque ela não tinha passado muito bem e poderia ter de ficar mais uma noite longe de casa.

Fomos até a clínica às 18h30. Depois, eu iria para um evento.,

Enquanto eu estacionava o carro, Maria entrou na sala e falou com Laila, que estava deitada sobre uma toalha, no chão, quase sem se mexer.

Entrei no local, abaixei-me e fiz um carinho. “O papai tá aqui”, falei.

Ela soltou um suspiro, quase um rosnado.

Aí saiu um líquido negro, pela boca, molhando boa parte do piso.

Era a morte chegando!

Deu mais um suspiro.

E em segundos já estava com os olhos vidrados e com a língua para fora.

Tinha nos esperado!

Meu Deus, sei lá por quantas longas horas, sei lá com quanta dor!

Tinha esperado pelas duas pessoas que amava no mundo: eu e Maria.

Ficamos arrasados e, ao mesmo tempo, orgulhosos da nossa cachorrinha,

Que sempre nos acompanhava em qualquer canto da casa e da vida.

Ao chegarmos na garagem, lá estava a Laila no portão!

Ao entramos na sala, quem é que estava nos esperando atrás da porta?

Na saída do banheiro!

Na primeira hora da manhã, ao abrir a porta do quarto!

Tem gente que não acredita em anjos e que é incapaz de perceber a sua companhia.

Eu e Maria tivemos a prova de que eles existem!

E agradecemos a Laila por ter zelado por nós e nos amado incondicionalmente, com um amor puro e verdadeiro que só os cães sabem dar.

Laila esteve conosco em todos os momentos.

E lutou, heroicamente, para passar o último instante ao nosso lado.

Um último sopro de vida, que nos enche de amor e ternura e que nos dará ânimo para prosseguir nessa dura, mas fascinante jornada.

Enquanto escrevo essa crônica sinto a presença da Laila ao meu lado.

Há pouco saí para caminhar.

É difícil voltar a percorrer o mesmo caminho que fazíamos juntos cotidianamente.

Mas é preciso, já que apesar dos avanços da medicina o principal para uma vida longa e boa é manter uma rotina saudável.

Talvez eu tenha conseguido manter a saúde, em tantos e tantos momentos difíceis, graças à obrigação diária que tinha de levar a Lailinha – e ainda o Kelev – para passear.

Foram 24 anos em que meus cachorrinhos ajudaram-me a combater o sedentarismo e talvez tenham me livrado de um infarto.

São filhos, amigos, preparadores físicos e anjinhos que, como já disse, tive ao meu lado durante quase duas décadas e meia.

Gostaria que vivessem mais.

Bem mais.

Mas também não seria justo que, apesar de filhos, sobrevivessem à nossa partida.

Mais que uma benção, seria uma tortura.

Eles nos protegem sempre. Mas não podem viver sem nosso amor e cuidados.

Humanos, cães e gatos sempre têm um fim.

Os anjos e o amor vivem para sempre!

Airton Gontow é jornalista, cronista e diretor do site de relacionamento Coroa Metade. A matéria foi escrita originalmente para o portal do “Estadão”, em abril de 2015.

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